A cadeia da soja começa a se mobilizar por um modelo de agricultura regenerativa viável de plantio em larga escala. Em um cenário de margens apertadas, em que os agricultores gastam cada vez mais para manter os níveis de produtividade, a estratégia pode reduzir custos e manter a competitividade do setor.
“Temos que sentar com os produtores e com os consumidores e pensar qual é o modelo de agricultura regenerativa que faz sentido para escalar esse processo”, afirma o presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), André Nassar, ao defender formação de uma mesa de negociação para acelerar o processo.
A ideia foi apresentada no debate “Por que a transição do modelo de produção da soja é crucial para o Brasil?”, realizado nesta terça-feira, 2/9, pelo Correio Braziliense e pelo Instituto Escolhas. O evento reuniu ainda representantes da Embrapa, da Aprosoja Brasil, do Grupo Associado de Agricultura Sustentável (GAAS), entre outros.
Produtividade limitada
Nassar chamou atenção para o crescimento limitado da produção da oleaginosa no Brasil, que esbarra no aumento gradual de insumos, especialmente fertilizantes. “A curva de produtividade é assintomática, ela vai subindo, mas uma hora vai chegando perto e a taxa de crescimento da produtividade vai caindo com o tempo”, avaliou.
O problema é que essa dependência tem se mostrado pouco eficiente quando comparada ao de outros grandes produtores mundiais. Em 2022, o Brasil precisou de 1 tonelada de fertilizantes à base de fósforo e potássio para colher 239 sacas de soja, enquanto a Argentina colheu 2.116 sacas com a mesma quantidade, por exemplo.
Os dados fazem parte de estudo do Instituto Escolhas e mostram que em 2023 o gasto com sementes, fertilizantes e agrotóxicos foi R$ 155 bilhões, ou 44% do valor bruto da produção. Dez anos atrás, essa proporção era de 30%. Assim, quem antes tinha que vender 11 sacas de soja para cobrir os gastos, agora precisa vender 23.
“Esses dados sinalizam para a necessidade de mudança e para o fato de que a soja precisa liderar essa mudança. O produtor sente no bolso a pressão do aumento dos custos dos insumos e dos custos de produção e, em consequência, a perda de rentabilidade”, disse Jaqueline Ferreira, diretora de Pesquisa do Instituto Escolhas.
Liderança garantida
A regeneração também foi apontada como estratégia para que o Brasil mantenha sua liderança global no setor. Ao priorizar a saúde do solo, ela reduz a dependência de insumos, diminuindo custos e aumentando a autonomia do país, que, para o presidente do GAAS, Eduardo Martins, já reúne condições para liderar essa transição.
“A primeira coisa chama-se custo de produção. É possível, com as práticas regenerativas, reduzir esse custo. E essa redução se dá, em grande parte, por substituição, no total, dos agrotóxicos e dos fertilizantes químicos”, explicou.
Outra vantagem da mudança é a resiliência frente às mudanças climáticas. “Nós precisamos de resiliência. E a gente resolve resiliência cuidando do solo e fazendo com que as áreas produtivas possam ter uma inserção adequada na paisagem rural”, acrescentou Martins.
Caminhos para a transição
O desafio apontado pelos especialistas é conduzir essa transição gradual, garantindo competitividade ao Brasil e segurança aos produtores. Nesse cenário, os sistemas de base biológica vêm ganhando espaço, por serem mais sustentáveis, entregarem alimentos de melhor qualidade e terem preferência no mercado consumidor.
Um dos avanços nesse sentido é a aprovação da Lei dos Bioinsumos, que para o Presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), Maurício Buffon, deve acelerar a adoção de práticas sustentáveis no campo. Ele ponderou, no entanto, que a transição precisa ser conduzida com cuidado para evitar prejuízos aos produtores.
“Não podemos esquecer tudo o que foi feito. Você não consegue virar a chave de uma agricultura de 46 milhões de hectares. É preciso cautela. Mas as novas tecnologias, principalmente o bioinsumo, já estão presentes nas lavouras. É um processo que vai levar de quatro a cinco anos para ganhar corpo”, avaliou.
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