Por André Garcia
Com a decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) de suspender a Moratória da Soja a partir de 2026, o agronegócio entra em uma nova fase: a de provar que é possível manter rastreabilidade e transparência ambiental sem retroceder na agenda de sustentabilidade que o próprio setor ajudou a construir.
Em lados opostos na disputa, produtores e tradings debatem alternativas. Para o colunista Guilherme Amado, do PlatôBR, o movimento natural será a judicialização da suspensão na Justiça Federal. Porém, diante de um cenário desfavorável, as companhias já se inclinam a costurar um acordo que reformule e abrande os termos da moratória.
Entre as opções estão a criação de um novo marco temporal — substituindo a referência de 2008 por uma data mais recente; a fixação de cotas de volume para soja rastreada; a exclusão de determinados territórios da chamada “lista negra” da moratória; e até mesmo a dispensa de pequenos produtores das exigências mais rígidas.
“Qualquer arranjo nesse sentido, contudo, teria de ser validado pelo Cade. Fontes no órgão reconhecem que há um risco concorrencial na manutenção da moratória como ela existe hoje. O entendimento é que ela não pode seguir sem ajustes. O tribunal do Cade já manifestou que o acordo, tal como está, não se sustenta”, avalia Guilherme.
O que está em jogo
Criada em 2008 como resposta à pressão por desmatamento zero na Amazônia, a moratória proibiu a compra de grãos cultivados em áreas desmatadas após aquele ano e se consolidou como um dos instrumentos mais eficazes de autorregulação ambiental do agronegócio brasileiro.
Segundo levantamento recente do MapBiomas, 74% da expansão agrícola no bioma ocorreu sobre áreas já desmatadas, principalmente pastagens. Os resultados comprovam o efeito do pacto: o cultivo da oleaginosa cresceu mais de 1.000% em áreas abertas, enquanto a conversão direta de vegetação nativa para soja caiu 68%.
Diante disso, especialistas alertam que, sem novos mecanismos de controle e rastreabilidade, o Brasil se distancia da meta de desmatamento zero prevista na NDC (Contribuição Nacionalmente Determinada) apresentada no Acordo de Paris.
Acordo sob pressão
O questionamento à moratória ganhou força neste ano, sobretudo entre produtores voltados ao mercado interno. Em fevereiro, a Cargill, uma das principais tradings, sinalizou saída parcial do pacto ao adotar 2020 como referência, em vez de 2008 — gesto que abriu brecha para que outras companhias revissem seus compromissos.
Em paralelo, estados como Mato Grosso aprovaram leis que restringem benefícios fiscais a empresas signatárias de compromissos ambientais. Em agosto, a Superintendência-Geral do Cade já havia revertido a moratória por meio de medida preventiva, decisão revertida logo depois pela Justiça Federal.
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