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COP27: Brasil pode ser pioneiro em zerar emissões líquidas

COP27: Brasil pode ser pioneiro em zerar emissões líquidasUm terço do que já foi desmatado foi derrubado nos últimos 30 anos. Foto: WWF

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O Brasil pode ser o primeiro país do mundo a zerar emissões líquidas de gases do efeito estufa até 2040. É o que concluem, a partir de dados e análises calculadas, pesquisadores brasileiros na COP27, a Conferência do Clima das Nações Unidas, que ocorre até dia 18 em Sharm El-Sheikh, no Egito. Segundo os especialistas, a característica do país em ter a maior parte das emissões ligada ao uso da terra, que inclui desmatamento e fogo associado, e às atividades agropecuárias, torna possível neutralizar a liberação dos gases que estão causando o superaquecimento do planeta com “relativa rapidez”.

“Se eliminarmos as emissões por uso da terra, dá uma redução de 77% nas emissões brasileiras em relação a 2005. Se considerarmos a variação de carbono no solo por manejo de pastagem, podemos tirar mais 230 milhões de toneladas que são absorvidas nos solos agrícolas. E se acrescentarmos nessa conta que é possível reduzir 200 milhões de toneladas de metano, nossas emissões praticamente seriam residuais. Lembrando, ainda, que quando reduzimos o desmatamento, isso aumenta a regeneração [e, por consequência, a absorção de gases do efeito estufa da atmosfera]. Podemos mudar esse quadro com relativa rapidez. É muito possível o Brasil ser o primeiro país com emissões líquidas zeradas, em algum momento entre 2030 e 2040”, explicou Tasso Azevedo, coordenador geral do MapBiomas.

A conclusão foi apresentada no painel “Uso da terra no Brasil: vilão, vítima ou herói da crise climática?”, que iniciou a programação do Brazil Climate Action Hub, espaço da sociedade civil brasileira na conferência do clima, nesta segunda-feira (14). A discussão foi moderada por Ana Toni, diretora do iCS (Instituto Clima e Sociedade), com participações também de Ane Alencar, diretora de Ciência no IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia) e coordenadora do MapBiomas Fogo, e de Michael Coe, diretor do programa Amazônia no Centro de Pesquisa do Clima Woodwell.

Entre os cinco maiores poluidores do mundo, o Brasil emitiu 2,42 bilhões de toneladas brutas de C02 (gás carbônico) equivalente em 2021. Foi o maior aumento em 19 anos, de 12,2% comparado ao ano anterior. A medida do CO2 equivalente representa a soma do efeito superaquecedor de todos os tipos de gases do efeito estufa na atmosfera. As emissões de outros grandes poluidores, como Estados Unidos, China e Rússia, estão mais atreladas à queima de combustíveis fósseis. As emissões brutas são tudo o que é emitido, enquanto que as emissões líquidas consideram os gases de efeito estufa que são removidos da atmosfera pela vegetação.

Uso da terra e emissões no Brasil

Segundo o mapeamento da iniciativa MapBiomas, o Brasil tem 66% do território coberto por vegetação nativa. “Isso não quer dizer que são todas áreas conservadas”, ponderou Azevedo. Desse total, 8,2% são áreas de vegetação secundária, por exemplo, que estão se recuperando por terem sido desmatadas ao menos uma vez nos últimos 36 anos.

O avanço do desmatamento na história recente preocupa os pesquisadores: um terço de tudo o que já foi desmatado em 500 anos foi derrubado nas últimas três décadas.

A ocupação do território por soja e pastagem também chama atenção. Cerca de 5% do país é soja: isso é mais do que somadas as áreas urbanas, de mineração e de floresta plantada. Já a pastagem ocupa 20% do território brasileiro. Se pastagens degradadas são fontes de emissão de carbono, pastagens bem manejadas têm papel na absorção de carbono da atmosfera. Em 2020, a rede MapBiomas calculou que 47% das pastagens no Brasil são bem manejadas, número que era de 30% no início dos anos 2000.

“41% de tudo o que foi queimado no Brasil nos últimos 36 anos está na Amazônia, sendo que a maioria desse fogo ocorre em áreas de pastagem, porque as pessoas fazem o manejo usando fogo. Então é preciso melhorar o manejo de pastagens nesse sentido”, destacou a diretora.

Juntas, a agropecuária e as mudanças por uso da terra no Brasil, que incluem desmatamento e fogo associado, respondem por 75% das emissões do país.

Grilagem

Na Amazônia, o aumento do desmatamento está diretamente relacionado à grilagem e à ocupação ilegal de terras públicas. Mais da metade (51%) da área desmatada no bioma está dentro dessas terras. A área registrada irregularmente como propriedade particular dentro de territórios indígenas no bioma no Brasil aumentou 55% entre 2016 e 2020 e o número de CAR (Cadastro Ambiental Rural) cresceu 75% no mesmo período.

Em 2022, o Brasil teve 80% mais incêndios florestais entre janeiro e outubro que o mesmo período em 2021.

“A gente tem dois caminhos de solução: um deles está direcionado ao comando e controle forte e inteligente, que passa por identificar transações financeiras [do crime organizado na Amazônia], destinar florestas públicas e tirar as florestas do mercado ilegal de terras. O outro caminho passa por incentivos positivos para a redução do desmatamento, precisa de recursos para fortalecer os estados, de maneira que tenham uma vigilância sobre o cumprimento do Código Florestal”, concluiu Alencar.

Fonte: Bibiana Alcântara Garrido/Ipam