HomeEcologia

Locomotiva do agro, Mato Grosso precisa descuidar de seus indígenas?

Locomotiva do agro, Mato Grosso precisa descuidar de seus indígenas?Índios Xavante, em Mato Grosso, à espera de atendimento para exames de Covid-19 em 2021. Foto: Mayke Toscano/Governo de Mato Grosso

Abertura de novas empresas de agropecuária em MT cresce 31%
Desmatamento zero e agricultura de baixo carbono devem ser prioridades para o Brasil
App revela se carne tem relação com desmatamento e trabalho escravo

O mato-grossense se orgulha da potência do agronegócio local, desenvolvido ao longo de décadas pelo suor de produtores que transformaram a terra do Cerrado nesta locomotiva produtiva. Chama atenção, no entanto, que esta economia tão robusta ainda conviva com altos níveis de brutalidade contra os povos indígenas de nossa terra.

Você sabia, por exemplo, que Mato Grosso ficou em terceiro lugar no País em mortalidade de crianças indígenas de 0 a 5 anos, com 106 casos, em 2021? As principais causas foram pneumonia não especificada, diarreia e gastroenterite de origem infecciosa e desnutrição proteico-calórica grave. O mato-grossense se pergunta: como o maior produtor de grãos e carne bovina do País permite a morte de crianças por desnutrição?

Esses dados, do Relatório “Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil” referente ao ano de 2021, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), nos levam a refletir se nosso gigantismo precisa dessas mortes e dos inúmeros conflitos que mancham nossa imagem.

Todos nós investimos pesado em tecnologias para aumentar a produtividade da terra. Ainda assim, o Estado está em segundo lugar no País em casos de conflitos (16) por direitos territoriais indígenas, o que incluem fraudes no Cadastro Ambiental Rural (CAR) e certificações de propriedades privadas sobre terras indígenas.

Os dados também colocam Mato Grosso em sexto lugar em volume de invasões de terras indígenas, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio, como destruição de moradias, cercas, barracas e casas, com ao menos 24 casos naquele ano.

Podíamos educar essa população e formar uma nova geração de profissionais para contribuir com o desenvolvimento do nosso Estado. No lugar disso, o Mato Grosso está entre os 3 piores Estados do Brasil a fornecer educação a esses povos. O caso em Barra do Bugres é exemplo disso: a Justiça teve de intervir para que o governo estadual terminasse a construção de um escola dos indígenas da etnia Umutina.

Na área da saúde ainda foi muito pior. Você sabia que Mato Grosso foi o Estado que mais deu as costas no Brasil a indígenas na área da saúde em 2021? Além da Covid-19, os indígenas do Estados enfrentaram uma explosão de casos de malária, diarréia e desnutrição. Em Santo Antônio de Leverger, recursos destinados à saúde indígena dos Bororo em 2008 e 2012 estavam sem cumprir sua finalidade até o ano passado. Os Xavante em Canarana, Água Boa, Paranatinga, Santo Antônio do Leste e Campinápolis estão há anos numa batalha para que água potável chegue em suas aldeias.

Como o líder de soja e milho, dono do maior rebanho do País, aceita conviver com situações como estas, apontadas pelo relatório do Cimi? Essa realidade não condiz com os valores cristãos do povo matogrossense. É preciso integrar os cidadãos mato-grossenses. O agronegócio mato-grossense que trabalha dentro da legalidade, a maioria, é preciso destacar, não combina com esses dados alarmantes.

Chiquitano

A situação da Terra Indígena Chiquitano, a 460 km de Cuiabá, chama atenção. Aguardando há décadas pela identificação e regularização pela Funai, as famílias vêm sofrendo tentativas de expulsão, destruição de suas roças de arroz, banana e milho pelo gado de pecuaristas vizinhos. Tiveram ainda seu cemitério ancestral desrespeitado e invadido, além de verem contaminadas as águas do córrego Tartaruga e do Rio Tarumã, do qual sobreviviam.

Além disso, a área da TI está situada entre os municípios de Pontes e Lacerda, Porto Esperidião e Vila Bela da Santíssima Trindade, onde há ocorrência de garimpos ilegais. No último mês, a Polícia Federal deflagrou a Operação Alfeu VI para dar cumprimento à decisão judicial que determinou a desocupação da área atingida por garimpeiros na região, bem como apreensão de maquinários e utensílios.

A quem interessa esse cenário de rios poluídos por mercúrio e outros metais pesados e insegurança jurídica? Ao agronegócio do bem, certamente não.