HomeEcologia

Saiba quem é a ‘maçã podre’ do agro que tenta extinguir o Parque Estadual Cristalino II

Saiba quem é a ‘maçã podre’ do agro que tenta extinguir o Parque Estadual Cristalino IIParque Cristalino II vive imbróglio jurídico. Foto: Prefeitura de Novo Mundo

Queimadas aumentaram 40% no Centro-Oeste em outubro
Embaixador da Alemanha condiciona liberação do Fundo Amazônia à redução do desmatamento
Na contramão de outros estados, MT perdeu superfície de água em 2022

Se até pouco tempo atrás o agronegócio se queixava de invasões de movimentos populares em terras improdutivas, hoje o setor lamenta as maçãs podres que contaminam a imagem de produtores rurais preocupados com a legalidade de seus negócios: o grileiro de terras, que é aquele que invade e rouba terra pública.

O caso da extinção do Parque Estadual Cristalino II, localizado em Novo Mundo (MT), é exemplar. Por trás desse movimento está a Sociedade Comercial e Agropecuária Triangulo Ltda, responsável por uma ação judicial que determinou a extinção do parque. O processo foi reaberto na sexta-feira, 5/8, conforme você lê aqui.

A Sociedade Comercial e Agropecuária Triangulo Ltda tem entre seus sócios Douglas Dalberto Naves, considerado “laranja” de um desmatador da Amazônia, Antônio José Junqueira Vilela Filho. Ao lado de outros membros da família Junqueira-Viacava (“Viacava” é o sobrenome do genro do patriarca dos Vilela, também acusado de envolvimento com os crimes ambientais), ele é responsável por alguns dos maiores desmatamentos já registrados na Amazônia.

Essa família é apresentada como representante do agro, mas agronegócio é isso mesmo? Ou se trata de alguém que ofusca o trabalho dos que trabalham de forma legal?

De acordo com reportagem do site “Midia Jur”, Antônio José Junqueira, conhecido como “AJ Vilela” ou “Jotinha”, é acusado pelo Ministério Público Federal (MPF) de chefiar uma quadrilha voltada à exploração ilegal e grilagem na Amazônia.

Ele foi alvo da Operação Rios Voadores, em 2016, na qual Douglas Dalberto Naves foi identificado como um dos supostos “laranjas” que ajudavam a esconder a presença do empresário em negócios ilícitos em Altamira (PA).

O Ministério Público Federal (MPF) atribui ao bando a responsabilidade pelo desmate de uma área maior que Belo Horizonte (330 km²) na floresta amazônica, em Altamira, no Pará. Segundo a acusação, a derrubada era feita com mão de obra escrava, crime pelo qual eles também respondem na Justiça.

O MPF identificou ainda que em ao menos um caso o “laranja” e seus familiares dividiram uma fazenda que havia sido embargada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), de modo que a área afetada pela fiscalização ficasse em nome do “laranja”, enquanto outras partes livres para exploração continuassem em nome de membros da família Junqueira-Viacava.

Lobby x falha processual

A Sociedade Comercial e Agropecuária Triangulo foi aberta em 1993, segundo o cadastro da Receita Federal, e tem como sede um endereço na Vila Ipojuca, região da Lapa, em São Paulo. A sede é uma casa em uma área predominantemente residencial. O registro atualizado na Receita mostra que Douglas Dalberto é sócio ao lado de Karin Sabec Viana e João Henrique Sabec Viana. Registros anteriores tinham Antonio José Viana Neto no quadro de sócios junto ao “laranja” de AJ Vilela.

A empresa registrada por Douglas Dalberto passou a questionar na Justiça a criação da área de proteção em 2011, dez anos depois do decreto de criação do parque, em 2001. A Sociedade Comercial e Agropecuária Triangulo Ltda alegava que a medida havia atingido três propriedades rurais onde criava gado desde 1994. Outro questionamento era de uma suposta falta de consulta pública à população local e às partes interessadas na área para a criação do parque.

Só que o Ministério Público do Mato Grosso não foi citado sobre a decisão da Justiça de extinguir o parque e sobre os prazos de recurso, o que é inconstitucional. Com o reconhecimento desta falha processual, agora o MP poderá recorrer a instâncias como o Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal.

Precedente?

Na quinta-feira, 11/08 o site investigativo “Repórter Brasil” também publicou reportagem sobre o assunto, na qual aponta suposta conivência do Estado de Mato Grosso por ter deixado passar o prazo legal para questionar a decisão.

“Caberia à PGE levar o processo para uma instância superior, mas isso precisa ser feito dentro de um rito que não aconteceu”, lamenta Edilene Fernandes do Amaral, consultora jurídica e de articulação do Observa-MT, um observatório socioambiental integrado por entidades da sociedade civil.

Agora, organizações ambientalistas temem que Cristalino se torne precedente para extinção de outras unidades de conservação. Um manifesto assinado por dezenas de entidades alerta que a decisão “abre um precedente para outras 18 Unidades de Conservação estaduais” que estão tendo sua existência questionada “por interesses privados”.

“Com isso, o Estado de Mato Grosso perderia 1,38 milhões de hectares de áreas protegidas, colocando em xeque os seus compromissos internacionais de redução de emissão de carbono, a credibilidade dos seus posicionamentos quanto à sustentabilidade do estado e os fluxos de recursos para o desenvolvimento de baixo carbono e a modernização das práticas agropecuárias”, criticam as organizações.