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Gigantes da carne se adiantam para manter mercado global

Gigantes da carne se adiantam para manter mercado globalProtocolo deve se tornar referência para exportadores. Foto: Reprodução/Embrapa

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Por André Garcia

A adoção de critérios ambientais e sociais mais rígidos por países importadores de carne brasileira já começa a gerar impactos concretos na cadeia pecuária. Os resultados ainda são limitados, mas empresas como JBS, Marfrig e Minerva sinalizam que a transição é inevitável — e que transformar exigências em vantagem competitiva é a melhor estratégia para garantir a lucratividade daqui para frente.

Ao lado de outras cinco gigantes do setor, essas empresas são signatárias do Protocolo de Monitoramento Voluntário de Fornecedores de Gado no Cerrado. Lançado há um ano, o projeto se estrutura agora para aplicar auditorias-piloto e estabelecer uma base de critérios que oriente frigoríficos e produtores, dificultando assim a comercialização de animais criados em áreas desmatamento, com embargos ou irregularidades trabalhistas.

“Não existe hoje um acesso coletivo à cadeia de fornecimento. As informações mais detalhadas só começarão a aparecer a partir da implementação das auditorias. Estamos realizando pilotos justamente para testar o protocolo e, a partir de 2026, iniciar um processo contínuo de auditoria”, explicou ao Gigante 163 o gerente de projetos do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), Lisandro Souza.

O Imaflora é uma das organizações à frente do projeto, coordenado em parceria com a Proforest e National Wildlife Federation (NWF). Mesmo que ainda não ofereça certificação, a iniciativa ajuda a aumentar o controle sobre a cadeia de fornecimento ao disponibilizar informações das empresas em uma plataforma bilíngue, a cerradoprotocol.net. Isso traz mais transparência ao processo.

Segundo Lisandro, as análises incluem cruzamento de dados do Cadastro Ambiental Rural (CAR), embargos ambientais, listas de trabalho escravo e informações da Guia de Trânsito Animal (GTA). São consideradas ainda informações sobre a produtividade do criador, para inibir a triangulação de animais provenientes de áreas com irregularidades ambientais ou sociais.

“O protocolo ajuda a fazer a decisão na hora adequada, que é na hora da compra. A ideia é orientar esse momento com critérios mínimos que hoje não são exigidos pela legislação”, acrescenta Souza.

Marcando posição no mercado externo

Não à toa, a perspectiva é que o protocolo se torne referência para exportadores, que terão à disposição dados das empresas em uma plataforma bilíngue, totalmente acessível. Tudo isso ganha mais peso a partir deste ano, quando o regulamento europeu contra o desmatamento entra na reta final de implementação, com exigências a partir dezembro.

Mas além da União Europeia, que já formalizou critérios ambientais rígidos, o Brasil precisa estar atento à China — principal compradora da carne bovina brasileira. Embora ainda não tenha oficializado exigências socioambientais, os chineses têm dado sinais de que a questão ganhará peso nas relações comerciais.

Em um cenário de guerra tarifária entre China e Estados Unidos, no qual o Brasil tenta tirar vantagem e ampliar a presença na China, os frigoríficos que adotam mecanismos de rastreabilidade e controle certamente terão vantagem ao demonstrar maior segurança jurídica e reputacional. Ou seja, mais do que nunca, o Protocolo pode funcionar como diferencial competitivo.

Por que o Cerrado?

Inspirado no projeto Boi na Linha, implantado na Amazônia desde 2019, o protocolo considera as especificidades do Cerrado na construção de seus critérios. Paralelamente ao avanço no combate ao desmatamento na Amazônia, o Cerrado se tornou o novo epicentro da prática, impulsionado pela expansão da fronteira agrícola. Só em 2023, o bioma respondeu por 61% do desmate no Brasil, totalizando 1.110.326 hectares, alta de 68% em relação a 2022.

“No Cerrado, a legislação exige uma reserva legal maior nas áreas produtivas. Isso implica uma taxa de conversão de vegetação mais alta, e exige um monitoramento mais rigoroso sobre essa conversão. O foco do protocolo é no monitoramento do desmatamento, legal ou ilegal, a partir de 2020”, afirma Lisandro.

Para se ter ideia do peso da ação, metade dos frigoríficos da Associação Brasileira de Indústrias Exportadoras de Carne (ABIEC) opera ali. Quando o Protocolo foi lançado, inclusive, a entidade chegou a manifestar publicamente a intenção de que todos os seus membros adotem padrões unificados de monitoramento até 2026, antecipando as exigências de conformidade ambiental dos países importadores.

“Quando a gente olha para esse mercado mais exigente, estamos falando de nove estados no Cerrado. A tendência é de evolução, e as associações estão atentas e querem pavimentar esse caminho de expansão. Por outro lado, o Ministério Público Federal também está de olho, principalmente nas regiões onde a fronteira agrícola é mais pujante”, conclui ele.

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