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Ligados ao câncer, agrotóxicos causam mortes no campo e na cidade

Ligados ao câncer, agrotóxicos causam mortes no campo e na cidadeA população nos centros urbanos também está em perigo.Foto: Reuters

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Por André Garcia

Nas frutas, nos vegetais, no leite materno, no ar e até mesmo nos solos de territórios protegidos – vestígios de agrotóxicos têm sido encontrados por toda parte. A questão está sob os holofotes desde o final de dezembro, quando foi sancionada, com vetos, a Lei 14.785, que cria um novo marco legal para produção, comercialização e uso desses produtos no Brasil.

Neste 11 de janeiro, quando é comemorado o Dia do Combate da Poluição por Agrotóxicos, o alerta sobre o uso desses produtos é intensificado por um cenário preocupante: o País despeja mais de um milhão de toneladas de agrotóxicos nas lavouras por ano, o que daria, em média, cinco quilos de veneno agrícola por pessoa, segundo levantamento do Instituto Nacional do Câncer (Inca).

“Enquanto vemos que vários países no mundo têm buscado fortalecer os sistemas alimentares mais sustentáveis, principalmente pós-pandemia, que já foi um indicador que este modelo de consumo e exploração desenfreada da natureza está falido, o Brasil infelizmente faz um caminho contrário”, disse em entrevista ao Gigante 163, a engenheira agrônoma e mestre em saúde pública, Fran Paula.

Associação com o câncer

De acordo com o Inca, as intoxicações agudas por agrotóxicos são as mais conhecidas e afetam, principalmente, os trabalhadores expostos aos produtos. Mas os danos não se restringem a eles. No Centro-Oeste, região líder na produção agrícola do País, são claros os efeitos nocivos em comunidades vizinhas às propriedades onde os químicos são utilizados, no ar, na água e nas cidades.

Em Goiás, só em 2023 foram registrados 480 casos de intoxicação por agrotóxicos. Pesquisadores da Universidade Federal de Goiás (UFG), avaliaram prontuários médicos de 1.453 pacientes entre os anos de 2010 e 2021 e concluíram que a exposição a esses produtos está relacionada ao desenvolvimento de câncer.

“As consequências do uso indiscriminado vão chegar nas unidades de saúde, na reabilitação e na recuperação das pessoas que estão contraindo doenças graves e crônicas”, avalia a gerente de Vigilância Ambiental e Saúde do Trabalhador da SES, Edna Covem.

Para além das porteiras

Em Mato Grosso, nos municípios de maior produção agrícola encontram-se as maiores taxas de abortamentos espontâneos entre mulheres em idade fértil (10 a 49 anos). Entre os anos de 2016 e 2018, houve 2.700 abortos espontâneos, sendo que 47,5% das mulheres que abortaram tinham entre 20 e 29 anos. Os dados são do Atlas dos Agrotóxicos, publicado em 2023.

Crédito: Atlas dos Agrotóxicos

Ao Gigante 163 a Secretaria de Estado de Saúde de Mato Grosso do Sul (Ses-MS) informou que no Estado foram registrados 340 casos de intoxicação no ano passado. O número representa um aumento de 25% em relação a 2022, quando foram contabilizados 272 casos.

“É uma contaminação sem fronteiras do solo e dos lençóis freáticos. Em estudos realizados no município de Poconé – em Mato Grosso- detectamos agrotóxicos na água das chuvas e de poços artesianos que servem para o abastecimento das comunidades”, diz Fran.

Ela acrescenta que, devido a essa ampla exposição, a população nos centros urbanos também está em perigo.

“Esses estudos demonstram que o agrotóxico é carregado para as cidades pelas águas. Ou seja, essas pessoas estão consumindo água com resíduos de agrotóxicos e isso não significa apenas uma violação para a saúde humana, mas uma violação ambiental e aos direitos da população.”

Alimentação em jogo

Não à toa, dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de 2023 mostraram que 25% dos alimentos de origem vegetal consumidos no Brasil tinham resíduos de agrotóxicos acima do permitido ou sem autorização. Do total de 1.772 amostras analisadas e coletadas em supermercados de todo o país, 41,1% não tinham resíduos e, em 33,9% delas, estes estavam dentro do limite permitido.

Neste contexto, Fran, que também é educadora da ONG Fase-MT e integra o Grupo de Especialistas na Agro-sócio-biodiversidade do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, reforça que qualquer nível de exposição a estes produtos é preocupante.

“Seja em curto, médio ou a longo prazo, eles podem desencadear inúmeras doenças e alteração do organismo das pessoas e também do meio ambiente. Não existe agrotóxico que não seja tóxico, todos têm níveis de toxicidade ao ser humano e ao meio ambiente.”, conclui.

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