Por André Garcia
A crise climática já provoca perdas significativas para a produção de mel no Brasil, mas os impactos vão além do setor apícola. Pesquisadores da Embrapa alertam que a redução das populações de abelhas, agravada por secas, enchentes e incêndios, também ameaça a produtividade de grãos como a soja, principal cultura do País.
No caso dos incêndios, o fogo consome as colmeias e o pasto apícola, que é o conjunto de plantas que fornecem os recursos necessários para alimentação de abelhas e para a produção de mel, pólen, própolis e cera. Municípios de São Paulo, do Pantanal Matogrossense e da Amazônia têm sentido esses efeitos.
“As colmeias que não são afetadas pelo fogo sofrem com os efeitos da fumaça. Estudos demonstram que a qualidade do ar foi afetada a distâncias que variavam de 120 km a 300 km de distância. As queimadas que atingiram o Pantanal em 2020 afetaram dez estados brasileiros, chegando à região Sul do país”, explica a pesquisadora Fábia Pereira.
Segundo a Federação Apícola e de Meliponicultura do Rio Grande do Sul, durante as enchentes que ocorreram naquele estado em 2024, entre 35 mil e 60 mil colmeias foram destruídas, causando impacto direto na apicultura, meliponicultura e produção de alimentos que dependem da polinização.
Liderança ameaçada
O Brasil tem consolidado sua posição como um dos principais produtores e exportadores de mel do mundo. Só em 2023 foram 64,2 mil toneladas, um crescimento de 2,7% em relação a 2022. Segundo a Embrapa, a produção avança de forma consistente desde 2016, com recordes sucessivos a partir de 2018.
Esses índices no entanto, estão sob risco, assim como a liderança brasileira na soja. Ao destacar a relação entre o mel e a produção agrícola, o pesquisador da Embrapa explica que os apicultores conseguem retirar até 30 quilos de mel por caixa na florada da soja – volume 63% superior à média brasileira, que é de 19 quilos por ano.
Na outra ponta da relação, a produtividade da soja é incrementada em cerca de 13% quando há presença de abelhas polinizando a lavoura. “Isso sem incremento no custo de produção”, destaca o pesquisador da Embrapa Soja, Decio Gazzoni.
Além dos impactos diretos na produção, a preservação das abelhas também traz ganhos comerciais.
“Esse cuidado com as abelhas é uma pauta importante para os países que importam nossa soja. Notícias de que nós estamos protegendo as abelhas fazem parte do currículo de bom comportamento do produtor e melhoram a nossa imagem”, afirma Gazzoni.
Aumento das temperaturas
Cientistas alertam que o cenário pode piorar nos próximos anos. As previsões indicam que todos os biomas do País serão afetados, com destaque para a Amazônia, que pode registrar um aumento de temperatura entre 1°C e 6°C, acompanhado por uma redução nas chuvas que varia de 10% a 45%.
No Pantanal, a temperatura deve subir de 1°C a 4,5°C, enquanto a diminuição das chuvas pode atingir entre 5% e 45%. Já no Cerrado, as temperaturas podem se elevar de 1°C a 5,5°C, com uma diminuição de 10% a 45% nas chuvas.
Para Fábia é importante encarar a mudança climática não apenas como um problema ambiental, mas como uma ameaça direta à produção de alimentos e à subsistência de comunidades rurais. A promoção de tecnologias e práticas adaptativas é um dos caminhos para assegurar o futuro da atividade.
“A frequência e a intensidade de eventos climáticos representam desafios significativos para a sobrevivência das colmeias e a produtividade da cadeia apícola. A urgência da situação exige uma resposta coordenada e eficaz para minimizar os prejuízos e garantir a sustentabilidade das atividades”, pontua.
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