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Sob ameaça, rios voadores podem diminuir chuvas no Centro-Oeste

Sob ameaça, rios voadores podem diminuir chuvas no Centro-OesteEl Niño potencializado piora ameaça sobre os rios voadores. Foto: Agência Brasil

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Por André Garcia 

Somada ao aquecimento global, a redução de florestas – associada ao desmatamento e às queimadas- tem levado as árvores do sul da Amazônia a “transpirarem” menos durante a estação seca, o que já resultou em um aumento de quatro e cinco semanas no período de estiagem em relação aos últimos 40 anos.

Estas mudanças, potencializadas pelo El Niño, representam uma ameaça direta a um delicado sistema de controle climático, mantido graças aos chamados “rios voadores”, fundamentais para fazer chover no resto País. Foi o que explicou ao Gigante 163 o cientista Carlos Nobre, um dos mais referenciados estudiosos de natureza e sustentabilidade do mundo.

“O transporte de vapor da água para fora da bacia amazônica corre muito risco por conta desta combinação, que está fazendo a Amazônia registrar menos chuva. Menos chuva significa menos evaporação e menos vapor d’água na atmosfera sendo transportado pelos rios voadores”, diz.

Na Natureza, o ciclo da chuva normalmente começa no oceano: a água evapora, e a umidade é carregada até o continente. Depois da chuva, a água fica no subsolo ou nos rios e retorna para o oceano. Mas, na Amazônia, as próprias árvores absorvem a água e, ao transpirarem, devolvem a umidade para a atmosfera, fazendo chover no Centro-Oeste, no Sudeste e Sul do País,  por meio de “cursos de água atmosféricos”, formados por massas de ar carregadas de vapor.

Regulação do clima

Cerca de metade da chuva ali é reciclada na própria floresta, antes de retornar ao oceano. Isso faz com que os rios voadores garantam as chuvas no Centro-Oeste e Sul do Brasil, permitindo a manutenção de rios e a irrigação de campos e plantações. Dito de outra forma, sem os rios voadores,  a agricultura e a pecuária deixam de existir.

O caminho dos rios voadores. Crédito: Projeto Rios Voadores

Ou seja, como estas correntes de vento e umidade determinam os ciclos climáticos locais e regionais, o desequilíbrio em sua formação afeta a estabilidade do clima e a sazonalidade das chuvas.

“Essa nova e forte onda de calor, que fez com que várias regiões registrassem temperaturas próximas dos 40ºC, ou até ultrapassem essa média, indica a necessidade de olhar para os rios voadores como parte fundamental na regulação do clima”, explicou Nobre

Prejuízo para o agro

Este serviço sistêmico nunca foi tão importante como agora, especialmente para o Centro-Oeste, que já enfrenta dificuldades relacionadas aos extremos climáticos. Sem a umidade do rio voador da Amazônia, o principal do Brasil, o Cerrado pode se tornar um deserto.

Ou seja , a produção agropecuária na região, que faz do País responsável pela maior produção e exportação de alimentos do mundo, não existiria. Isso porque a umidade deste rio voador se transforma em chuva, principalmente no período de outubro a março, momento do plantio e desenvolvimento de culturas importantes, como soja e milho, que serão utilizadas como base para a ração de bois, porcos e aves.

El Niño turbinado

Com relação ao El Niño, o cientista explica que o aquecimento global tem induzido estiagens mais frequentes e intensas. Como já mostrado por nós, a seca histórica que atinge o bioma já interrompeu o tráfego de navios e aumentou os custos das rotas comerciais da região Norte, elevando os riscos para as exportações de milho, por exemplo.

“Nós tivemos seca na Amazônia em 2005, 2010, 2015, 2016, em 2020 e agora essa seca muito intensa em 2023 que, possivelmente continuará em 2024, em função deste El Niño que está adquirindo uma intensidade muito grande. Isso está associado ao aumento da temperatura global, que deixa os oceanos mais quentes e causa este tipo de fenômeno.”

Bomba d’àgua

A Floresta Amazônica funciona como uma bomba d’água. A quantidade de vapor emitido pelas árvores pode ter a mesma ordem de grandeza, ou mais, que a vazão do rio Amazonas (200.000 m3/s), graças aos serviços prestados da floresta.

Estudos promovidos pelo Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA) já mostraram que uma árvore com copa de 10 metros de diâmetro é capaz de bombear para a atmosfera mais de 300 litros de água, em forma de vapor, em um único dia – ou seja, mais que o dobro da água que um brasileiro usa diariamente.

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