Mesmo com a criação de um protocolo para orientar compras responsáveis de gado, os frigoríficos que operam no Cerrado seguem significativamente expostos ao desmatamento ligado à conversão de áreas nativas em pastagens. Um ano após o lançamento do Protocolo de Monitoramento Voluntário de Fornecedores de Gado no Cerrado, a adesão ainda é baixa, e os gargalos no rastreamento da cadeia produtiva comprometem a efetividade da iniciativa.
De acordo com dados divulgados pela iniciativa Do Pasto ao Prato (dPaP) e repercutidos por veículos como Globo Rural, apenas cinco empresas, entre elas JBS, Marfrig, Minerva, Frigol e Masterboi, aderiram formalmente ao protocolo, cobrindo 35 das 225 plantas frigoríficas no bioma.
Na prática, isso representa 38,8% da capacidade total de abate e uma exposição direta a 33,6% do desmatamento associado à expansão de pastagens na região.
Monitoramento limitado e adesão restrita
O Protocolo do Cerrado estabelece 11 critérios socioambientais para orientar a compra de gado.
Entre eles, estão a verificação de sobreposição com desmatamento ilegal, trabalho escravo, áreas protegidas e a exigência de cadastro ambiental atualizado. No entanto, o monitoramento exigido ainda se restringe aos fornecedores diretos, ou seja, à última fazenda antes do abate, deixando de fora as etapas de cria e recria, onde muitas vezes se concentram os maiores impactos sobre a vegetação nativa.
“Apesar dessas empresas estarem assumindo um compromisso de monitoramento dos seus fornecedores na região, mesmo assim continuam expostas”, afirmou Dari Santos, coordenadora de impacto da dPaP.
Outro ponto de atenção é o baixo engajamento do varejo. Das mais de 1.250 redes supermercadistas atuando no Brasil, apenas duas, o Grupo Carrefour Brasil e o Grupo Pão de Açúcar (GPA), assinaram o protocolo.
Ainda assim, ambas continuam comprando carne de frigoríficos que não aderiram formalmente à iniciativa. A ONG estima que as vendas dessas redes estejam ligadas a um desmatamento superior a 83 mil hectares no Cerrado.
Entre as empresas mais expostas ao risco socioambiental, segundo o relatório, estão Assaí Atacadista, Mateus Supermercados, Supermercados BH, Irmãos Muffato e Atacadão Dia a Dia, que ainda não firmaram compromissos públicos nem divulgam dados de monitoramento.
Cerrado ameaçado
O Cerrado é o bioma mais desmatado do país na última década. Só entre 2015 e 2024, a perda de vegetação nativa superou 0,4% de todo o território, o dobro do registrado na Amazônia no mesmo período.
“Cabe, mais uma vez, a gente colocar em pauta medidas multissetoriais, com participação da sociedade civil, dos atores do setor e do governo, para que o Cerrado tenha uma proteção efetiva — e não apenas baseada em um protocolo voluntário com baixa adesão”, concluiu Santos.
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